Transpõe a Directiva n.º 97/66/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 1997
A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º, das alíneas b) e c) do nº 1 do artigo 165.º e do nº 3 do artigo 166 da Constituição, para valer como lei geral da República, o seguinte:
Artigo 1.º Objecto e âmbito
1 – A presente lei aplica-se ao tratamento de dados pessoais no sector das telecomunicações, especificando e complementando as disposições da Lei da Protecção de Dados Pessoais.
2 – As disposições da presente lei asseguram a protecção dos direitos e interesses legítimos dos assinantes que sejam pessoas colectivas, compatíveis com a natureza destas.
3 – As excepções à aplicação da presente lei que se mostrem estritamente necessárias para protecção da segurança do Estado, da defesa, da segurança pública e da prevenção, investigação ou repressão de infracções penais são definidas em legislação especial.
Artigo 2.º Definições
Para efeitos da presente lei, e sem prejuízo das definições constantes do artigo 3ºda Lei da Protecção de Dados Pessoais, entende-se por:
“Assinante”: Qualquer pessoa singular ou colectiva que seja parte num contrato com o prestador de serviços de telecomunicações acessíveis ao público para o prestação de tais serviços;
“Utilizador”: Qualquer pessoa singular que utilize um serviço de telecomunicações acessível ao público para fins privados ou comerciais, sem ser necessariamente assinante desse serviço;
“Rede pública de telecomunicações”: O conjunto de meios físicos, denominados infra-estruturas, ou electromagnéticos que suportam a transmissão, recepção ou emissão de sinais e utilizado, total ou parcialmente, para o fornecimento de serviços de telecomunicações acessíveis ao público;
“Serviço de telecomunicações”: A forma e o modo da exploração do encaminhamento ou distribuição de informação através de redes de telecomunicações, com excepção da radiodifusão sonora e da televisão.
Artigo 3.º Serviços abrangidos
1 – A presente lei é aplicável ao tratamento de dados pessoais em ligação com a oferta de serviços de telecomunicações acessíveis ao público nas redes públicas de telecomunicações, nomeadamente através da Rede Digital com Integração de Serviços (RDIS) e das redes públicas móveis digitais.
2 – Os artigos 8º a 10º são aplicáveis às linhas de assinante ligadas a centrais digitais e, sempre que tal seja tecnicamente possível e não exija esforço económico desproporcionado, às linhas de assinante ligadas a centrais analógicas.
3 – Compete ao Instituto das Comunicações de Portugal confirmar os casos em que seja tecnicamente impossível ou que exijam um investimento desproporcionado para preencher os requisitos dos artigos 8º a 10º e comunicar esse facto à Comissão Nacional de Protecção de Dados que, por sua vez, notifica a Comissão Europeia, pelas vias competentes.
Artigo 4.º Segurança
1 – O prestador de um serviço deve adoptar todas as medidas técnicas e organizacionais necessárias para garantir a segurança dos serviços de telecomunicações acessíveis ao público que presta e, se necessário, no que respeita à segurança da rede, deve fazê-lo conjuntamente com o operador da rede pública que suporta o serviço.
2 – As medidas referidas no número anterior devem ser adequadas à prevenção dos riscos existentes, tendo em conta a proporcionalidade dos custos da sua aplicação e o estado de evolução tecnológica.
3 – Em caso de risco especial de violação da segurança da rede, o prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público deve informar os assinantes da existência desse risco, bem como das soluções possíveis e respectivos custos.
Artigo 5.º Confidencialidade das comunicações
1 – Os prestadores de serviços e os operadores de rede devem garantir a confidencialidade e o sigilo das comunicações através dos serviços de telecomunicações acessíveis ao público e das redes públicas de telecomunicações.
2 – É proibida a escuta, a colocação de dispositivos de escuta, o armazenamento ou outros meios de intercepção ou vigilância de comunicações por terceiros, sem o consentimento expresso dos utilizadores, com excepção dos casos especificamente previstos na lei.
3 – O disposto na presente lei não obsta à gravação de comunicações, no âmbito de práticas comerciais lícitas, para o efeito de prova de uma transacção comercial ou de qualquer outra comunicação de negócios, desde que o titular dos dados tenha sido disso informado e dado o seu consentimento expresso.
Artigo 6.º Dados de tráfego e de facturação
1 – Os dados do tráfego relativos aos utilizadores e assinantes tratados para estabelecer chamadas e armazenados pelo operador de uma rede pública de telecomunicações ou pelo prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público devem ser apagados ou tornados anónimos após a conclusão da chamada.
2 – Para finalidade de facturação dos assinantes e dos pagamentos das interligações, podem ser tratados os seguintes dados:
Número ou identificação, endereço e tipo de posto do assinante;
Número total de unidades a cobrar para o período de contagem, bem como o tipo, hora de início e duração das chamadas efectuadas ou o volume de dados transmitidos;
Data da chamada ou serviço e número chamado;
Outras informações relativas a pagamentos, tais como pagamentos adiantados, pagamentos a prestações, cortes de ligação e avisos.
3 – O tratamento referido no número anterior apenas é lícito até final do período durante o qual a factura pode ser legalmente contestada ou o pagamento reclamado.
4 – Para efeitos de comercialização dos seus próprios serviços de telecomunicações, o prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público pode tratar os dados referidos no nº 2, se o assinante tiver dado o seu consentimento.
5 – O tratamento dos dados referentes ao tráfego e à facturação deve ser limitado ao pessoal dos operadores das redes públicas de telecomunicações ou dos prestadores de serviços de telecomunicações acessíveis ao público encarregados da facturação ou da gestão do tráfego, da informação e assistência a clientes, da detecção de fraudes e da comercialização dos próprios serviços de telecomunicações do prestador e deve ser limitado ao que for estritamente necessário para efeitos das referidas actividades.
6 – O disposto nos números anteriores não prejudica o direito de as autoridades competentes serem informadas dos dados relativos à facturação ou ao tráfego nos termos da legislação aplicável, para efeitos da resolução de litígios, em especial os litígios relativos às interligações ou à facturação.
Artigo 7.º Facturação detalhada
1 – O assinante tem o direito de receber facturas detalhadas ou não detalhadas.
2 – No caso de ter optado pela facturação detalhada, o assinante tem o direito de exigir do operador a supressão dos últimos quatro dígitos.
3 – As chamadas facultadas ao assinante a título gratuito, incluindo chamadas para serviços de emergência ou de assistência, não devem constar da facturação detalhada.
Artigo 8.º Apresentação e restrição da identificação da linha chamadora e da linha conectada
1 – Quando for oferecida a apresentação da identificação da linha chamadora, o utilizador chamador deve ter a possibilidade de, através de um meio simples e gratuito, e por chamada, eliminar a apresentação da identificação da linha chamadora.
2 – O assinante chamador deve ter, linha a linha, a possibilidade referida no número anterior.
3 – Quando for oferecida a apresentação da identificação da linha chamadora, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples e gratuito, dentro dos limites da utilização razoável desta função, impedir a apresentação da identificação da linha chamadora das chamadas de entrada.
4 – Quando a apresentação da identificação da linha chamadora for oferecida e a identificação dessa linha for apresentada antes do estabelecimento da chamada, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples, rejeitar chamadas de entrada sempre que a apresentação da identificação da linha chamadora tiver sido eliminada pelo utilizador ou pelo assinante autor da chamada.
5 – Quando for oferecida a apresentação da identificação da linha conectada, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples e gratuito, eliminar a apresentação da identificação da linha conectada ao utilizador autor da chamada.
6 – O disposto nos nºs 1 e 2 é aplicável às chamadas para países que não pertençam à União Europeia originadas em território nacional; o disposto nos nºs 3 a 5 é aplicável a chamadas de entrada originadas em países que não pertençam à União Europeia.
7 – Se for oferecida a apresentação da identificação da linha chamadora ou da linha conectada, os prestadores de serviços de telecomunicações acessíveis ao público devem informar o público do facto e das possibilidades referidas nos nºs 1 a 5, designadamente nos contratos de adesão.
Artigo 9.º Excepções
1 – Os operadores de uma rede pública de telecomunicações e os prestadores de um serviço de telecomunicações acessível ao público podem anular a eliminação da apresentação da identificação da linha chamadora quando compatível com os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade:
Por um período de tempo não superior a trinta dias, a pedido, feito por escrito, de um assinante que pretenda determinar a origem de chamadas mal intencionadas ou incomodativas, caso em que os números de telefone dos assinantes chamadores que tenham eliminado a identificação da linha chamadora são registados e comunicados ao assinante chamado pelo operador da rede pública de telecomunicações ou pelo prestador do serviço de telecomunicações acessível ao público;
Numa base linha a linha, para as organizações com competência legal para receber chamadas de emergência, designadamente, as forças policiais, os serviços de ambulância e os bombeiros.
2 – A existência do registo e da comunicação a que se refere a alínea a) do número anterior deve ser objecto de informação ao público e a sua utilização deve ser restringida ao fim para que foi concedida.
Artigo 10.º Reencaminhamento automático de chamadas
Os operadores de uma rede pública de telecomunicações e os prestadores de um serviço de telecomunicações acessível ao público devem assegurar aos assinantes, gratuitamente e através de um meio simples, a possibilidade de interromper o reencaminhamento automático de chamadas efectuado por terceiros para o seu equipamento terminal.
Artigo 11.º Listas de assinantes
1 – Os dados pessoais inseridos em listas impressas ou electrónicas de assinantes acessíveis ao público ou que se possam obter através de serviços de informações telefónicas devem limitar-se ao estritamente necessário para identificar um determinado assinante, a menos que este tenha consentido inequivocamente na publicação de dados pessoais suplementares.
2 – O assinante tem o direito de, a seu pedido e gratuitamente:
Não figurar em determinada lista, impressa ou electrónica;
Opor-se a que os seus dados pessoais sejam utilizados para fins de marketing directo;
Solicitar que o seu endereço seja omitido total ou parcialmente;
Não constar nenhuma referência reveladora do seu sexo.
3 – Os direitos a que se refere o nº 2 são conferidos aos assinantes que sejam pessoas singulares ou pessoas colectivas sem fim lucrativo.
Artigo 12.º Chamadas não solicitadas
1 – As acções de marketing directo com utilização de aparelhos de chamada automáticos ou de aparelhos de fax carecem do consentimento prévio do assinante chamado.
2 – O assinante tem o direito de se opor, gratuitamente, a receber chamadas não solicitadas para fins de marketing directo realizadas por meios diferentes dos referidos no número anterior.
3 – Os direitos a que se referem os números anteriores são conferidos aos assinantes quer sejam pessoas singulares quer colectivas.
4 – As obrigações decorrentes do presente artigo recaem sobre as entidades que promovam as acções de marketing directo.
Artigo 13.º Características técnicas e normalização
1 – O cumprimento da presente lei não pode determinar a imposição de requisitos técnicos específicos dos equipamentos terminais ou de outros equipamentos de telecomunicações que impeçam a colocação no mercado e a livre circulação desses equipamentos nos países da União Europeia.
2 – Exceptua-se do disposto no número anterior, e na ausência de normas europeias comuns, a elaboração e emissão de características técnicas específicas necessárias à execução da presente lei, as quais devem ser comunicadas à Comissão Europeia, nos termos dos procedimentos previstos na Directiva n.º 83/189/CEE do Conselho, de 28 de Março de 1983, relativa a um procedimento de informação no domínio das normas e regulamentações técnicas.
Artigo 14.º Legislação subsidiária
1 – Em tudo o que não esteja previsto na presente lei, designadamente em matéria de tutela administrativa e jurisdicional, responsabilidade civil e sanções, são aplicáveis, consoante o caso, as disposições dos artigos 33º a 49º da Lei da Protecção de Dados e as normas sancionatórias previstas na legislação sobre telecomunicações.
2 – São sempre puníveis a tentativa e a negligência.
Artigo 15.º Preterição de regras de segurança e violação do dever de confidencialidade
Constituem contra-ordenação, punível com a coima prevista no artigo 33º, nº 2, do Decreto-Lei n..º 381-A/97, de 30 de Dezembro:
A preterição de regras de segurança previstas no artigo 4º;
A violação do dever de confidencialidade previsto no artigo 5º
Artigo 16.º Outras contra-ordenações
1 – Praticam contra-ordenação punível com coima de 100 000$ a 1 000 000$ as entidades que:
Não assegurarem o direito de informação ou de obtenção do consentimento, nos termos previstos no artigo 5º, nº 3;
Não observarem as obrigações estabelecidas nos artigos 6º a 12º.
2 – A coima é agravada para o dobro dos seus limites mínimo e máximo se a contra-ordenação for praticada por pessoa colectiva.
Artigo 17º Processamento e aplicação de coimas
1 – Compete à Comissão Nacional de Protecção de Dados o processamento das contra-ordenações e a aplicação das coimas por violação dos artigos 5º, nº 3, 6º, 11º e 12º do presente diploma.
2 – O processamento das restantes contra-ordenações compete ao Instituto das Comunicações de Portugal.
3 – O destino das coimas é, em função da entidade a quem compete o seu processamento, o previsto no artigo 42º da Lei da Protecção de Dados ou no artigo 34º do Decreto-Lei nº 381-A/97, de 30 de dezembro.
Artigo 18º Disposições finais e transitórias
1 – É dispensado o consentimento previsto no nº 4 do artigo 6º relativamente ao tratamento de dados pessoais já em curso à data da entrada em vigor da presente lei, desde que os assinantes sejam informados deste tratamento e não manifestem o seu desacordo no prazo de sessenta dias.
2 – O artigo 11º não é aplicável às edições de listas publicadas antes da entrada em vigor da presente lei ou que o sejam no prazo de um ano, sem prejuízo do cumprimento das obrigações previstas pela legislação anterior.
Artigo 19.º Entrada em vigor
A presente lei, que transpõe para a ordem jurídica interna a Directiva nº 97/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 1997, relativa ao tratamento de dados pessoais e à protecção da privacidade no sector das telecomunicações, entra em vigor no dia 24 de Outubro de 1998.
Aprovado em 1 de Outubro de 1998
Promulgado em 13 de Outubro de 1998.
Referendado em 16 de Outubro de 1998.