A preocupação do juiz com os impactos econômicos das decisões
– uma análise conciliatória com as teorias hermenêuticas pós-positivistas
RESUMO
Como as decisões judiciais podem impactar a economia, a busca pela segurança jurídica a fim de reduzir as incertezas e imprevisibilidade, especialmente quando capazes de provocar riscos sistêmicos em alguns setores da atividade econômica, é uma reivindicação legítima. A consideração aos impactos econômicos da decisão judicial está em consonância com o pós-positivismo e com as teorias hermenêuticas que buscam superar a exagerada discricionariedade judicial. Se o que se busca, com as novas teorias hermenêuticas, é fornecer padrões determinados, para que a previsibilidade e justiça da resposta (judicial) sejam alcançadas, fazendo-se uma ponderação equilibrada entre princípios e regras (em vista das circunstâncias do caso concreto), mantendo a coerência e integridade do sistema jurídico, então requerer atenção do Juiz para com os reflexos de sua decisão corresponde exatamente a isso, a impedir que crie novos direitos, a evitar que profira juízos de valor que possam ser incoerentes com o sistema.
PALAVRAS-CHAVE: Analise Econômica do Direito. Economia. Ativismo Judicial. Pós-positivismo. Hermenêutica. Interpretação. Integridade. Dworkin. Streck. Direitos Fundamentais. Hermenêutica Filosófica.
1. Introdução
Não é de hoje a discussão sobre o impacto econômico das decisões judiciais. Propiciar decisões judiciais mais seguras, visando à distribuição da Justiça e estabilidade das relações sociais, é um objetivo bem antigo e perseguido constantemente. A busca pela segurança jurídica, a fim de reduzir as incertezas provocadas pela atuação judiciária, que pode levar a decisões predominantemente políticas e ideológicas ou exageradamente impregnadas de subjetivismos, sempre foi, aliás, uma preocupação constante da teoria do direito. O surgimento de novas teorias hermenêuticas, em substituição ao positivismo, embora fomentado pela necessidade de se encontrar outras “fontes de direito” (além do texto da lei) e, dessa forma, impregnar as decisões de um maior conteúdo moral[2], propiciando um maior grau de justeza, também foi impulsionado pela necessidade de se evitar “decisionismos” decorrente do “poder discricionário” do Juiz, com o qual o positivismo se contentava como (único) recurso para solução de casos complexos.
No estágio atual do desenvolvimento social, a discussão sobre os efeitos das decisões judiciais sobre a economia ganha ainda mais contorno. A busca pela segurança jurídica a fim de reduzir as incertezas nas relações contratuais passou a ser um mantra de economistas e representantes do empresariado e, talvez por decorrência, preocupação de renomados juristas e pensadores do Direito. De fato, existe uma constatação científica de que a atividade do Judiciário influencia diretamente a economia, no sentido de que, quanto maior a imparcialidade e previsibilidade (e, portanto, confiança no sistema), maior o desenvolvimento econômico e social. As transações e negócios econômicos são regulados por meio de contratos, que funcionam como fórmula para alocação de riscos entre os agentes econômicos. Uma indevida ou exagerada interferência judicial posterior nessas relações acaba por eliminar essa função dos contratos, aumentando os riscos e custos da atividade econômica. Como a essência dos contratos é a assunção (promessa) de obrigações recíprocas (entre os contratantes), para possibilitar o pleno potencial das trocas, uma ruptura do trato inicial (ainda que em parte) por meio da intervenção judicial elimina a previsibilidade que um dos contratantes tinha ao envolver-se originalmente no negócio. Essa possibilidade repercute no desenvolvimento econômico, já que aumenta os riscos da atividade de um dos contratantes. Quanto maior o grau de previsibilidade e estabilidade nas relações contratuais, no sentido de que as partes cumpram com suas promessas (voluntariamente ou forçadas), também será proporcionalmente maior o número de investimentos e negócios a serem realizados. Se, ao contrário, o grau de interferência judicial, no sentido de alteração das cláusulas contratuais, desobrigando uma das partes da prestação originalmente assumida, é exagerado ou ocorre por opções pessoais dos juízes, numa avaliação subjetiva e calcada em elementos ideológicos na interpretação das normas vigentes, tal situação pode efetivamente aumentar os custos associados a um determinado setor da economia, prejudicando o desenvolvimento econômico[3].
A falta de garantias ou previsibilidade quanto ao efetivo cumprimento das obrigações contratuais pode prejudicar ainda mais acentuadamente os investimentos de longo prazo. A atividade empresarial em determinados setores da economia, a exemplo de produção e distribuição de energia, telecomunicações, indústria de medicamentos, tecnologia da informação e atividade bancária (só para citar alguns), exige profunda especialização, investimento maciço e planejamento de longo prazo. Estudos recentes demonstram que a qualidade do sistema Judiciário é um fator preponderante no momento de decidir pela alocação de recursos para empreendimentos nessas áreas. Um sistema judicial imparcial e eficiente incentiva os investidores a atuarem de maneira coordenada na produção de bens, fazendo investimentos e planejando atuação a longo prazo, já que ficam eliminados (ou atenuados) os riscos associados a futuras rupturas das promessas (contratos) originalmente celebrados (muitas vezes contratos de concessão com o Poder Público).
A exigência de previsibilidade nos negócios aumenta em razão da competitividade empresarial cada vez maior, proporcionada pelo fenômeno da globalização. Esse processo, explica Castelar Pinheiro[4], provoca uma maior exigência por regulamentação, acentuando a dependência do contrato como instrumento regulador das transações transnacionais e evidenciando ainda mais a relação entre direito e economia. A globalização exige uma maior integração entre as nações, no que tange às trocas e transações econômicas, e aqueles países que não dispuserem de sistemas e instituições políticas eficientes, no sentido de garantir a regularidade dessas operações comerciais, distanciam-se e perdem espaço nesse processo global, deixando de produzir riquezas e promover o desenvolvimento social e econômico. Em outras palavras, o fortalecimento das instituições internas (aí incluído o sistema Judiciário) é condição indispensável para que os países (em especial aqueles com economias menos robustas) participem como atores integrados ao processo de globalização, para que possam se beneficiar dos efeitos da economia em escala mundial. Em outras palavras, o modelo globalizante exige dos países a melhoria e reformas de suas instituições políticas, sob pena de não integração na economia mundial. Como afirma Castells, a competitividade na nova economia global parece depender muito da capacidade política das instituições nacionais, para impulsionar a estratégia de crescimento de um país frente aos outros, sendo premente a necessidade das reformas necessárias para obter a eficiência do sistema judicial[5].
O fato é que, no mundo atual, caracterizado pela rapidez nas informações e trocas comerciais (proporcionadas por redes de comunicação informatizadas), a eficiência dos sistemas judiciários, para que funcionem de forma imparcial, segura e eficiente, é uma exigência social cada vez maior. Os sistemas políticos internos das nações (sobretudo as menos desenvolvidas) devem procurar acompanhar as mudanças que se dão a nível mundial, como requisito essencial para o desenvolvimento econômico. Os sistemas judiciários, nesse sentido, têm que proporcionar, para não servirem como empecilho ao desenvolvimento econômico, maior confiabilidade e previsibilidade.
O problema da imprevisibilidade das decisões judiciais é mais acentuado no Brasil, onde a constância de decisões contraditórias parece abalar a confiança dos jurisdicionados no sistema político-judiciário. O “ativismo judicial” recente, verificado em decisões da Suprema Corte e mesmo em outras instâncias inferiores, parece ser hoje uma das marcas[6] do nosso Judiciário (ao lado da morosidade). Nos últimos anos, “uma persistente crise de representatividade, legitimidade e funcionalidade no âmbito do Legislativo tem alimentado a expansão do Judiciário nessa direção, em nome da Constituição, com a prolação de decisões que suprem omissões e, por vezes, inovam na ordem jurídica, com caráter normativo geral”[7]. Se o “ativismo” judiciário tem um lado positivo, já que a atitude proativa dos juízes, na determinação de direitos que se encontram apenas em estado latente ou de forma nem sempre clara na Constituição e nas leis, resulta na concretização de políticas públicas e consagração de “promessas não cumpridas de modernidade”, não se pode deixar de perceber o risco dessa postura judicial, pelo menos quanto à expectativa em relação à titularidade de direitos que partes de um processo judicial possam ter (ou não), em determinadas circunstâncias.
Somado a isso, ainda temos o problema da excessiva “judicialização das relações sociais”, fenômeno que revela a transferência do poder político e decisório para o Judiciário, para resolver questões antes afetas a outras instâncias de poder ou a grupos socialmente organizados. Além da posição claramente ativista que o Judiciário brasileiro tem assumido, em algumas circunstâncias, existe na nossa sociedade uma tendência a se levar todo e qualquer tipo de conflito para ser resolvido por juízes, órgãos que exercem a jurisdição estatal. Segundo Luís Roberto Barroso, essa característica do atual momento político e social brasileiro tem causas múltiplas, algumas revelando uma tendência mundial, mas outras especificamente relacionadas com o nosso modelo institucional. Para ele, a constitucionalização abrangente de direitos, o aumento da demanda por justiça por parte dos cidadãos e a ascensão institucional do Poder Judiciário provocaram essa intensa judicialização das relações políticas e sociais[8]. A constitucionalização abrangente fez com que inúmeras matérias que antes eram deixadas para a legislação inferior fossem içadas à categoria de mandamentos e princípios constitucionais e, na medida em que um direito individual, uma prestação estatal, um fim ou política pública é disciplinado no nível constitucional, abre-se a possibilidade de os interessados ingressarem em juízo a fim de obter, pelas mãos do Judiciário, ações concretas omitidas pelos administradores públicos[9]. Uma vez que a Constituição consagrou tantos direitos, as pessoas redescobriram a cidadania perdida e se conscientizaram em relação aos próprios direitos, o que também funcionou aumentando consideravelmente o número de demandas judiciais. E, por fim, a promulgação da Constituição de 1988, ao atribuir garantias funcionais aos juízes, também promoveu uma reafirmação do Poder Judiciário como poder político. Recuperadas as liberdades democráticas e as garantias da magistratura, o Judiciário passou a desempenhar suas funções institucionais com altivez e independência, ocupando o espaço político a ele reservado ao lado do Executivo e do Legislativo. Essa afirmação institucional, obviamente, modificou a relação da sociedade com o Poder Judiciário, que passou a ser visto com mais confiabilidade e como desaguadouro natural dos anseios pela efetividade de direitos[10].
Ainda podemos elencar outros fatores que fomentaram esse fenômeno da demasiada judicialização das relações sociais. Além da criação de novos direitos no texto constitucional, nas últimas décadas houve uma significativa renovação dos serviços judiciários, cujo exemplo maior consistiu na criação dos “Juizados de Pequenas Causas” (depois substituídos pelos Juizados Cíveis), instituídos para funcionar regulados por procedimento simplificado e despojado de formalidades, possibilitando uma maior abertura da ordem processual para a defesa dos interesses individuais e coletivos[11]. Tendo por pano de fundo um procedimento centrado em três aspectos fundamentais – a isenção de taxas e custas, a desnecessidade de representação por advogado e a celeridade processual -, favoreceu a universalização da jurisdição, permitindo o acesso à Justiça de parcelas cada vez maiores da sociedade, em especial dos menos favorecidos pela fortuna, e possibilitando que pequenos litígios que, antes, não eram levados ao conhecimento dos juízes, passassem a fazer parte do dia-a-dia das cortes judiciárias, revelando o efeito do que se convencionou chamar de “litigiosidade contida”[12]. Esses órgãos judiciários especializados, aliados a outras iniciativas de política processual, que vingaram sob a influência das teorias da efetividade do processo e introduziram novos tipos de ações e ampliaram a legitimação para a tutela de interesses, terminaram também por promover a excessiva judicialização dos fatos sociais. Se antes falava-se em “litigiosidade contida”, por falta de instrumentos de acesso à Justiça, talvez hoje já se possa perceber uma “litigiosidade desenfreada”. A possibilidade de se ingressar em juízo sem qualquer ônus processual inicial ou possibilidade de responsabilização, promove a multiplicidade de lides temerárias[13]. Também a nossa cultura, refratária ou pouco habituada a qualquer outra forma alternativa de solução de disputas, favorece a que toda sorte de conflito termine sendo decidido no Judiciário. A Lei da Arbitragem[14] ainda não se mostrou capaz de popularizar entre nós esse instituto, deixando que possíveis usuários continuem recorrendo à tutela processual estatal para resolver suas controvérsias. “O Poder Judiciário deixou de ser a ultima ratio. Ao invés, é o primeiro passo na resolução de conflitos de interesses que vão desde o pequeno entrevero entre vizinhos até as grandes demandas societárias”[15].
Todo esse conjunto de fatores leva a uma crescente intervenção judiciária na vida dos brasileiros, fazendo com que toda e qualquer matéria, mesmo aquelas originadas de construções sociais mais simples e aparentemente incapazes de gerar conflito, terminem sendo decididas num tribunal. A judicialização excessiva num país de grande extensão territorial com uma complexa organização judiciária, reforçada pela atual tendência ao ativismo judicial, oferece as condições para o surgimento de decisões contraditórias (ainda que em casos idênticos), demasiadamente impregnadas de cunho político e ideológico e sem qualquer respeito aos precedentes e a uma visão integracionista do sistema de normas. Sem que se tenha alguma coerência sistêmica, em termos de segurança jurídica quanto ao resultado das decisões judiciais, tal situação corrói a confiabilidade no Poder Judiciário. As incertezas provocadas pela atuação judiciária, em termos de imprevisibilidade das decisões dos juízes (mesmo em casos semelhantes), arranham a imagem do Poder Judiciário, como alerta Lenio Streck, que cunhou a expressão de “Justiça lotérica” para diagnosticar a profusão de decisões conflitantes e, muitas vezes, sem qualquer possibilidade de harmonização teórico-hermenêutica, que caracteriza o funcionamento do Judiciário brasileiro. Essa prejudicial “criatividade” decisional dos juízes brasileiros, explica o mencionado jusfilósofo, “é causada pela ânsia do juiz de ir além do que diz a lei e fazer prevalecer a sua consciência”[16].
Ora, se é um dos maiores jusfilósofos brasileiros que reconhece a excessiva “subjetivação” de muitos julgados produzidos por tribunais e juízes brasileiros, não é demasiado exigir – como de fato o faz Lenio Streck – uma maior responsabilidade (accountability) dos juízes no momento da fundamentação da decisão, de forma a torná-la mais adequada com a integridade e a coerência do Direito (sistema de leis e a Constituição). Nesse sentido, parece razoável a reclamação de alguns setores produtivos quanto à exigência de decisões mais previsíveis, baseadas nas normas vigentes, evitando decisões alternativas ou predominantemente políticas. Obter decisões judiciais seguras, visando à realização de negócios e investimentos econômicos, é uma reivindicação tão legítima quanto qualquer outra, afinal os princípios relacionados à atividade econômica encontram-se condensados na Constituição Federal[17] e se apóiam na forma econômica capitalista, fundamentados na liberdade da iniciativa privada e apropriação privada dos meios de produção[18]. Reclamar que os magistrados prestem mais atenção às conseqüências econômicas de suas decisões, por conseguinte, equivale de modo indireto a exigir respeito aos princípios e regras que regulam a atividade econômica[19]. Se um dos objetivos da nossa república é a erradicação da pobreza, isso só se faz com desenvolvimento econômico, para suprir as necessidades coletivas de emprego, alimentação, saúde, saneamento e outros serviços públicos essenciais. Se o cumprimento das promessas constitucionais depende do desenvolvimento econômico, o Juiz tem o dever de examinar se sua decisão pode de qualquer forma afetá-lo. Por isso, o magistrado, no momento de decidir um caso, deve estar atento às múltiplas variáveis que o compõem, não podendo se cingir a apenas um único interesse envolvido. Como adverte o Desembargador Rogério Gesta Leal, “é preciso haver uma sensibilização da magistratura brasileira para a complexidade das relações sociais, marcadas hoje por variados fatores. Um tema que aparentemente é jurídico, no sentido de ser tratado e regulado por lei, tem implicações de natureza econômica, social e política. Essas dimensões extra-normativas precisam ser consideradas pelo julgador”[20].
Estudos mostram que, em diversos casos, decisões judiciais podem impactar negativamente as relações econômicas no Brasil, repercutindo no desenvolvimento, visto que interfere na expectativa dos agentes econômicos. Essa realidade justifica que os magistrados devam ter o cuidado, por decorrente de sua responsabilidade funcional de fundamentar adequadamente suas decisões, de examinar detidamente as repercussões econômicas de seus julgados, o que contribui para a integridade e eficiência do sistema e da segurança jurídica. A obtenção de decisões judiciais seguras possibilita negócios e investimentos, diminuindo o “risco jurídico” que os torna pouco atrativos, fazendo com que cumpram sua função social, impulsionando o desenvolvimento. Portanto, nas situações que comportem mais de uma solução plausível, nada impede que o Juiz busque a que seja mais correta à luz dos reflexos econômicos de sua decisão.
É importante deixar claro que, com essa afirmativa, não se está advogando uma “auto-contenção” do Judiciário ou uma volta ao conservadorismo existente antes do processo de redemocratização, quando juízes e tribunais, premidos pela falta de garantias funcionais, atuavam mais à semelhança de um “departamento técnico especializado”, sem desempenhar qualquer papel político. Nem tampouco se cuida de pretender um direito de feitio vazio de valores, sem qualquer conteúdo, cuja atividade resume-se a chancelar as relações de fato criadas pelos agentes econômicos. Apenas se defende que, “em uma perspectiva de análise econômica do direito, a opção por uma norma e não pela outra, deve se dar a partir da escolha da norma que seja mais eficiente, economicamente. Significa, pois, analisar a demanda sob o aspecto de eficiência. Ao juiz cabe avaliar o impacto que as decisões ocasionarão”[21].
Uma avaliação legal completamente neutra, que desconsidere o fator econômico, é que significa um retrocesso. O que se quer é que o Juiz ou intérprete desperte para a extrema importância que as decisões judiciais representam para o desenvolvimento sócio-econômico do país. O que se pretende é que, para propiciar previsibilidade, estabilidade e integridade (em relação ao sistema normativo), o Juiz tenha também uma perspectiva de análise econômica do direito. Se fatores econômicos estão envolvidos desde a criação e elaboração das leis, porque não se levá-los também em consideração quando se trata de reduzir o texto legal à norma do caso concreto? Não se trata, portanto, “de substituir critérios de justiça por critérios econômicos, mas de perceber que os agentes econômicos mudam as estratégias à medida que a justiça se demonstra ineficiente e a economia injusta”[22].
Claro que, quando se está diante de direitos fundamentais da pessoa humana, ou outros valores constitucionais de maior realce, o critério da eficiência econômica não pode prevalecer. Só poderá prevalecer fator econômico se estiver ligado também a outro princípio constitucional de igual peso, se sua prevalência significar a preservação de outro valor constitucional fundamental. Quando se depara com situações de colisão de princípios, o intérprete deve, à luz dos elementos do caso concreto, proceder a uma ponderação dos valores e interesses em jogo. “Sua decisão deverá levar em conta a norma e os fatos, em uma interação não formalista, apta a produzir a solução justa para o caso concreto, por fundamentos acolhidos pela comunidade jurídica e pela sociedade em geral”[23].
Analisando a questão sob esse prisma, a consideração aos impactos econômicos da decisão judicial está em consonância com o pós-positivismo e com as teorias hermenêuticas que buscam superar a exagerada discricionariedade judicial. Se o que se quer é evitar a insegurança jurídica, proporcionada pelo subjetivismo decisional, isso significa sem sombra de dúvidas estar em linha de adequação ao pós-positivismo. Se o que se defende é que o Juiz, diante de um caso complexo, faça uma condensação de valores, preocupado com a unificação e integridade do sistema de normas, para formular decisão que evite o risco de “efeitos sistêmicos” na economia, tal proceder se coaduna com as premissas das teorias hermenêuticas pós-positivistas.
Adiante procuraremos demonstrar essa conciliação, entre a preocupação com os efeitos sistêmicos na economia que uma decisão judicial pode oferecer e a vanguarda das teorias hermenêuticas pós-positivistas, uma vez que essas teorias buscam parâmetros para alguma objetividade, para evitar que o recurso a princípios jurídicos (constitucionais) se torne uma “abertura” legitimadora de escolhas tão arbitrárias quanto as proporcionadas pela discricionariedade judicial (do positivismo). Se o que se busca, com as novas teorias hermenêuticas, é fornecer padrões determinados, para que a previsibilidade e justiça da resposta (judicial) sejam alcançadas, fazendo-se uma ponderação equilibrada entre princípios e regras (em vista das circunstâncias do caso concreto), mantendo a coerência e integridade do sistema jurídico, então requerer atenção do Juiz para com os reflexos de sua decisão corresponde exatamente a isso, a impedir que crie novos direitos, a evitar que profira juízos de valor que possam ser incoerentes com o sistema.
Para alcançar a finalidade do presente trabalho, faremos uma breve análise dos fundamentos de algumas das teorias hermenêuticas pós-positivistas, com destaque para a teoria da integração de Ronald Dworkin. É certo que esse pensador desenvolveu críticas relevantes ao “liberalismo utilitarista”[24], no sentido de que os juízes erram quando buscam fundamentar suas decisões exclusivamente em regras ou argumentos de ordem econômica, sem levar em consideração os princípios (que têm conteúdo moral)[25]. Já deixamos claro nossa posição de que o que o Juiz não pode é fazer uma apreciação completamente neutra, que desconsidere o fator econômico, mas, deparando-se com direitos fundamentais ou outros valores constitucionais de maior realce, o critério da eficiência econômica obviamente não pode prevalecer.
Também analisaremos, no presente trabalho, excertos do pensamento de Lenio Luiz Streck, defensor da hermenêutica filosófica como o método mais adequado para resolver problemas de atividade interpretativa.
2. Algumas teorias hermenêuticas do pós-positivismo
Uma das questões mais controvertidas da teoria geral do direito diz respeito ao papel do Juiz quando tem que decidir casos difíceis, assim considerados aqueles que não podem ser submetidos a uma regra de direito clara, estabelecida de antemão pelo legislador. Quando as premissas da lei contêm toda a informação necessária e suficiente para se resolver um problema (caso) concreto, a operação do intérprete se resume a um “deducionismo”. Já não havendo uma subsunção evidente do caso à hipótese legal, o raciocínio lógico-dedutivo não consegue dar conta do problema e o aplicador deve se valer de outro procedimento interpretativo (mais elaborado e complexo).
Para o positivismo jurídico, nessas hipóteses, o Juiz age dentro do seu “poder discricionário”, mas na verdade ele legisla “novos direitos”, e em seguida os aplica retroativamente aos casos em questão. Em lugar de simplesmente aplicar o “direito antigo”, o Juiz parece criar direito novo (e politicamente controverso). Nesses casos, abre-se para ele a possibilidade da criação de uma nova regulamentação jurídica objetivando a complementação do sistema, considerando a falta de previsão do fato a uma norma efetivamente válida. As teorias do “realismo legal”[26], que desmascarou a doutrina ortodoxa segundo a qual competia aos juízes apenas aplicar as regras existentes, mostraram que eles respondem a diferentes estímulos sociais e pessoais, e em seus arrazoados apelam para princípios de justiça e políticas públicas.
Em contraposição ao positivismo jurídico, tornou-se necessário desenvolver novas teorias hermenêuticas, uma vez que se deve evitar a insegurança jurídica (proporcionada pela discricionariedade judicial), garantindo-se o direito das partes a uma decisão correta, mesmo que não haja uma lei clara sobre o caso específico delas. Muitas teorias foram formuladas com o propósito de resolver a seguinte questão: como os juízes deveriam chegar às suas decisões a fim de atender da melhor maneira possível aos objetivos da jurisdição? De fato, o maior desafio dado ao operador do direito constitui na melhor interpretação. Os juízes divergem, quando têm que decidir os casos difíceis, no tocante à natureza e ao núcleo dos direitos e princípios jurídicos fundamentais. A necessidade, portanto, de dinamizar a aplicação correta da norma bem como a ação do juiz quando da elaboração de uma sentença, com métodos de interpretação atrelados à prática efetiva da justiça, dentro dos moldes do Estado Democrático de Direito, deu ensejo ao surgimento de diversas teorias hermenêuticas. Lenio Streck explica que o objetivo dessas teorias é o de fornecer suporte teórico para a melhor solução interpretativa. Diz o mencionado jusfilósofo: “A guinada hermenêutica sofrida pelo direito em tempos de efetivo crescimento do papel da jurisdição – mormente a jurisdição constitucional – acentuou a preocupação em torno da necessidade de discutir as condições que o intérprete tem para a atribuição dos sentidos aos textos jurídicos, uma vez fracassadas as experiências exegético-subsuntivas e as tentativas de controlar os sentidos através de operações lógico-analíticas. As diversas concepções sobre como interpretar e como aplicar têm como objetivo alcançar respostas corretas ou a “melhor resposta”, metódica ou conteudisticamente”[27].
Os chamados pós-positivistas buscam através de teorias como as da Argumentação Jurídica[28], da Integração e da Tópica Jurídica – respectivamente de Robert Alexy, Ronald Dworkin e Chaïm Perelman – as respostas para a melhor interpretação, tendo como pedra de toque o equilíbrio entre segurança jurídica e justiça, considerando os princípios constitucionais como chave para a exegese.
2.1. Teoria Integracionista de Ronald Dworkin
Ronald Dworkin refuta a teoria da discricionariedade, característica do positivismo jurídico, segundo a qual, diante de casos difíceis, o Juiz fica livre para decidir. A partir dessa teoria, quando o juiz decide um caso difícil, ele legisla novos direitos jurídicos, e os aplica retroativamente. Por isso, essa teoria da decisão é totalmente inadequada, uma vez que causa insegurança jurídica e, provavelmente, gera decisões injustas. Dworkin propõe uma teoria da interpretação que auxilia os operadores do Direito a encontrar uma resposta correta mesmo para os casos complexos. Acredita esse jurista que os juízes, ao resolverem os casos difíceis, devem utilizar padrões determinados, para que a previsibilidade e justiça da resposta sejam alcançadas. “Dworkin, contrapondo-se ao formalismo legalista e ao mundo de regras positivistas, busca nos princípios os recursos racionais para evitar o governo da comunidade por regras que possam ser incoerentes”[29] com o sistema. Para ele, o juiz não tem o direito de criar novos direitos, mas sim descobrir quais são eles em conformidade com o ordenamento jurídico. A concepção positivista do Direito que o percebe apenas como um modelo de regras, ignorando outros padrões (políticas e princípios), é insuficiente para resolver os casos difíceis.
Para que se descubram quais direitos que a parte tem, é necessário que se conheçam os princípios políticos que inspiraram a Constituição. Esses princípios auxiliam a leitura da Constituição, limitando seu conteúdo e auxiliando nos casos difíceis. É imprescindível também que, para uma resposta correta aos casos difíceis, o Juiz leve em consideração as decisões anteriores dos tribunais (precedentes), atentando para os argumentos de princípio que os fundamentaram[30]. Para interpretar a lei (descobrir a intenção da lei), o aplicador tem que desenvolver uma operação que a vincule aos princípios que subjazem às regras positivas do direito (e em especial à Constituição), com atenção para os argumentos de princípio e de políticas públicas que embasaram casos anteriormente julgados[31].
Essas premissas são as bases da Teoria da Integridade, que em termos simples significa que os juízes devem julgar de forma coerente e fundamentada nos princípios, a fim de estabelecer uma interpretação construtiva da prática jurídica e expressar um sistema harmonioso, evitando a aplicação de direitos diferentes (a casos semelhantes) e estendendo a cada um dos cidadãos da comunidade os padrões fundamentais de justiça. O princípio ou teoria da integridade desenvolvida por Dworkin, como modelo de interpretação construtiva do direito, abre possibilidades além da norma que norteia um caso concreto, pois o Juiz, embora sem desconsiderar a legislação vigente, deve recorrer a princípios e políticas públicas, abstendo-se de “inventar” o direito. A existência de um dever legal do juiz de analisar de modo mais abrangente as fontes da lei, inclusive no que toca a princípios não convencionais, é a chave da interpretação construtiva, do direito como integridade (de normas). Por esse meio, a instância interpretativa se torna capaz de decidir os casos difíceis[32], sem os elementos de incerteza jurídica decorrentes da discricionariedade. A decisão judicial será mais segura e adequada quanto mais dispuser de informações fáticas e conceitos interpretativos. “É a integridade do direito e sua reconstrução que devem dar a resposta nos casos difíceis”[33].
Do que acima se transcreveu, pode se perceber a elevada importância dada por Dworkin aos princípios jurídicos, como fonte da interpretação integracionista. Para ele, mesmo as decisões dos tribunais que são consideradas decisões políticas importantes, podem ser lidas como decisões tomadas com base em princípios, uma vez que as decisões de princípios são aquelas baseadas nos direitos que as pessoas têm a partir da Constituição, e não em políticas que buscam realizar objetivos coletivos[34]. Ele explica que quando o jurista se depara com casos difíceis, geralmente recorre a outros padrões jurídicos, como princípios e políticas. Nas questões judiciais difíceis, diz ele, “os princípios desempenham um papel fundamental nos argumentos que sustentam as decisões a respeito de direitos e obrigações jurídicos particulares”[35]. Na sua concepção, política é o tipo de padrão que estabelece um objetivo a ser alcançado, em geral uma melhoria em algum aspecto econômico, político ou social da comunidade. Já princípio é um padrão jurídico que deve ser observado não porque vá promover ou assegurar uma situação econômica, política ou social considerada desejável, mas porque “é uma exigência de justiça ou eqüidade ou alguma outra dimensão da moralidade”[36]. Os princípios possuem uma dimensão que as regras comuns não têm[37] – em peso e importância – e quando se intercruzam, “aquele que vai resolver o conflito tem que levar em conta a força relativa de cada um”. Havendo conflito entre princípios, o “princípio relevante para o problema jurídico particular fornece uma razão em favor de uma determinada solução”[38].
2.2 A “era dos princípios”
A recorrência aos princípios, como se viu, é a tônica das teorias interpretativas pós-positivistas. O pós-positivismo promove uma volta aos valores, enfatiza o papel dos princípios “enquanto resgate da moral expungida do direito pelo positivismo[39]. A ênfase dada aos princípios é atribuída em reconhecimento à sua normatividade. Materializados na Constituição, que consagra valores da ordem jurídica e social, os princípios desempenham funções importantes para a atividade interpretativa, condicionando o atuar do hermeneuta. “A Constituição altera (substancialmente) a teoria das fontes que sustentava o positivismo e os princípios vêm a propiciar uma nova teoria da norma (atrás de cada regra há, agora, um princípio que não deixa se “desvencilhar” do mundo prático)”[40].
Havendo colisão normativa entre princípios constitucionais, o conflito é resolvido através da ponderação, daí que não ocorre o aniquilamento de um princípio em favor de outro, mas apenas que, no caso concreto, deve ser escolhido aquele que produza o resultado mais socialmente desejável. Não há superioridade formal entre os princípios em tensão, mas “a simples determinação da solução que melhor atende o ideário constitucional da situação apreciada”.
Mas mesmo o método ou solução da ponderação de princípios não é por si só suficiente. “A vanguarda do pensamento jurídico dedica-se, na quadra atual, à busca de parâmetros de alguma objetividade, para que a ponderação não se torne uma fórmula vazia, legitimadora de escolhas arbitrárias. É preciso demarcar o que pode ser ponderado e como deve sê-lo. A teoria dos princípios não importa no abandono das regras ou do direito legislado. Para que possa satisfazer adequadamente à demanda por segurança e por justiça, o ordenamento jurídico deverá ter suas normas distribuídas, de forma equilibrada, entre princípios e regras”[41].
Advertência semelhante é feita por Lenio Streck. Ele sustenta que a Constituição, embora constituída de normas de significados mais “abertos”, não autoriza repostas múltiplas para um mesmo problema, sob pena de incorrer e voltar ao mesmo erro do positivismo, de permitir que a discricionariedade dê margem a decisionismos e arbitrariedades interpretativas. Para ele, “são incompatíveis com a hermenêutica as teses que sustentam que o advento dos princípios e das cláusulas gerais possibilitam uma (maior) “abertura” (liberdade) interpretativa em favor dos juízes, circunstância que recoloca no paradigma neconstitucionalista, a principal característica do positivismo: a discricionariedade”[42]. Defensor da hermenêutica filosófica como o método mais adequado para resolver problemas de atividade interpretativa, ele reverbera contra o processo que se tornou comum hoje, entre os operadores do direito, de enxergar um novo e específico princípio em cada quadrante do direito, para a superação de qualquer dificuldade interpretativa. Segundo Streck, é possível alcançar aquilo que pode ser denominado de “a resposta hermeneuticamente adequada à Constituição“. A resposta adequada é conseguida através de um “exame da coerência e da integridade” com o sistema jurídico em um determinado caso. Os fatos e circunstâncias que rodeiam e caracterizam um caso específico (faticididade) é de fundamental importância para o processo hermenêutico e, sem que o intérprete leve isso em consideração, na definição do alcance de um princípio, não chegará à “resposta correta”, em termos de atribuição de sentido ao texto de forma integrada e coerente com o sistema jurídico. Diz ele: “Os sentidos são atribuíveis a partir da faticidade em que está inserido o intérprete e respeitando os conteúdos de base do texto, que devem nos dizer algo”[43]. E completa: “Assim, quando hoje – em pleno paradigma principiológico, neoconstitucionalista e superador do positivismo que se sustenta(va) pela regra e pela subsunção – tudo parece indicar que é vencedora a tese da realização do direito (norma) “somente na situação concreta”, não podemos cair na armadilha do axiologismo, possibilitando uma espécie de retorno à discricionariedade positiva, como se os princípios proporcionassem ainda mais abertura na interpretação dos juízes “no caso concreto”[44]. O sentido do texto da Constituição, dos princípios que ela incorpora, só pode ser perfeitamente atribuído no momento em que o julgador (ou intérprete) faz a aplicação, para a resolução de um caso concreto. É no momento da aplicação que se pode compreender o sentido do princípio constitucional, como diz o citado jurista: “o texto da Constituição só pode ser entendido a partir de sua aplicação. Entender sem aplicação não é um entender. A applicatio é a norma(tização) do texto constitucional”[45].
Conclusões:
1ª. Como as decisões judiciais podem impactar a economia, a busca pela segurança jurídica a fim de reduzir as incertezas e imprevisibilidade das decisões judiciais, especialmente quando capazes de provocar riscos sistêmicos em alguns setores da atividade econômica, é uma reivindicação legítima.
2ª. Se o grau de interferência judicial, no sentido de alteração das cláusulas contratuais, desobrigando uma das partes da prestação originalmente assumida, é exagerado ou ocorre por opções pessoais dos juízes, numa avaliação subjetiva e calcada em elementos ideológicos na interpretação das normas vigentes, tal situação pode efetivamente aumentar os custos associados a um determinado setor da economia, prejudicando o desenvolvimento econômico.
3ª. Em uma perspectiva de análise econômica do direito, a opção por uma solução e não pela outra, deve se dar a partir da escolha daquela que evite riscos sistêmicos em um determinado setor da economia ou de qualquer maneira impeça ou dificulte o desenvolvimento econômico.
4ª. Quando se está diante de direitos fundamentais da pessoa humana, ou outros valores constitucionais de maior realce, o critério da eficiência econômica não pode prevalecer. Só poderá prevalecer o fator econômico se estiver ligado também a outro princípio constitucional de igual peso, se sua prevalência significar a preservação de outro valor constitucional fundamental.
5ª. Quando se depara com situações de colisão de princípios, o intérprete deve, à luz dos elementos do caso concreto, proceder a uma ponderação dos valores e interesses em jogo, levando também em conta a norma e os fatos, em uma interação apta a produzir a solução justa (e conforme a Constituição) para o caso concreto.
6ª. A consideração aos impactos econômicos da decisão judicial está em consonância com o pós-positivismo e com as teorias hermenêuticas que buscam superar a exagerada discricionariedade judicial. Já que a finalidade é evitar a insegurança jurídica, proporcionada pelo subjetivismo decisional, isso significa sem sombra de dúvidas estar em linha de adequação ao pós-positivismo. Se o que se defende é que o Juiz, diante de um caso complexo, faça uma condensação de valores, preocupado com a unificação e integridade do sistema de normas, para formular decisão que evite o risco de “efeitos sistêmicos” na economia, tal proceder se coaduna com as premissas das teorias hermenêuticas pós-positivistas.
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[1] Doutorando do curso de Direito da Universidade Estácio de Sá (RJ).
[2] Tendo em vista a co-originariedade entre direito e moral, de certa forma abandonada pelo positivimo.
[3], Décio Zylbersztajn e Rachel Sztajn. Direito & Economia. Análise Econômica do Direito e das Organizações.Rio de Janeiro: Elsevier 2005.p.103-104.
[4] Armando Castelar Pinheiro. Direito e economia num mundo globalizado: cooperação ou confronto. Disponível: www.an.org.br/arquivo/destaques/armando_castelar_pinheiro.pdf.Acesso em 09.out.2007. Apud
[5] Manuel Castells. A sociedade em rede. 2 ed.v.1 São Paulo: Paz e Terra, 1999, p 12-18.
[6] O ativismo judiciário, ao invés de configurar propriamente um problema, revela um lado positivo da atuação dos juízes brasileiros, em uma sociedade carente da concretização de direitos fundamentais. De fato, o “ativismo” geralmente se manifesta quando o Poder Legislativo se mostra incapaz para suprir as demandas sociais pela concretização de direitos, daí o surgimento da atitude mais avançada do Judiciário, como protagonista de decisões que implicam em escolhas morais e implementação de políticas públicas e, portanto, preenchendo espaços políticos antes reservado aos outros poderes. Como explica Luís Roberto Barroso, “o ativismo judicial é uma atitude, a escolha de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição, expandindo o seu sentido e alcance. Normalmente ele se instala em situações de retração do Poder Legislativo, de um certo descolamento entre a classe política e a sociedade civil, impedindo que as demandas sociais sejam atendidas de maneira efetiva” (em Judicialização, Ativismo Judicial e Legitimidade Democrática, artigo publicado no site Conjur, em 22.12.08). Mas, como alerta o citado constitucionalista, “decisões ativistas devem ser eventuais, em momentos históricos determinados”, pois “não há democracia sólida sem atividade política intensa e saudável, nem tampouco sem Congresso atuante e investido de credibilidade”.
[7] Luís Roberto Barroso, ob. cit.
[8] Em Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito, artigo publicado na Revista de Direito Administrativo n °240, 2005.
[9] “Na medida em que uma questão – seja um direito individual, uma prestação estatal ou um fim público – é disciplinada em uma norma constitucional, ela se transforma, potencialmente, em uma pretensão jurídica, que pode ser formulada sob a forma de ação judicial. Por exemplo: se a Constituição assegura o direito de acesso ao ensino fundamental ou ao meio-ambiente equilibrado, é possível judicializar a exigência desses dois direitos, levando ao Judiciário o debate sobre ações concretas ou políticas públicas praticadas nessas duas áreas” (Luís Roberto Barroso).
[10] Esse último fator de “judicialização” das relações sociais é descrito por Luís Roberto Barros como “ascensão institucional do Poder Judiciário”. Descreve esse fenômeno na seguinte passagem de sua obra:
“Uma das instigantes novidades do Brasil dos últimos anos foi a virtuosa ascensão institucional do Poder Judiciário. Recuperadas as liberdades democráticas e as garantias da magistratura, juízes e tribunais deixaram de ser um departamento técnico especializado e passaram a desempenhar um papel político, dividindo espaço com o Legislativo e o Executivo. Tal circunstância acarretou uma modificação substantiva na relação da sociedade com as instituições judiciais, impondo reformas estruturais e suscitando questões complexas acerca da extensão de seus poderes” (em Neoconstitucionalismo e Constitucionalização do Direito).
[11] Demócrito Reinaldo Filho. Comentários à Lei 9.099/95. Editora Saraiva. 1995.
[12] Demócrito Reinaldo Filho. Ob. cit.
[13] As penas previstas para a litigância de má-fé, no art. 14 e seguintes do CPC, parecem não ser suficientes para desestimular as lides temerárias. Isso ocorre pela dificuldade de cobrança posterior da multa aplicada e até mesmo pela exagerada parcimônia que os juízes revelam na aplicação dessas sanções processuais.
[14] Lei n.º 9.307/96.
[15] Pedro Câmara Raposo Lopes faz considerações sobre aspectos sociológicos de nossa formação cultural, que levam os brasileiros a preferirem a solução estatal a qualquer outra forma de solução de conflitos, comprometendo o passivo judicial. Diz ele: “Sociologicamente, explica-se a morosidade pela formação ibérica do povo brasileiro, que recebe com suspeita todo ato que não conte, de alguma forma, com o sufrágio estatal. Confia-se mais no terceiro imparcial do que na contraparte que, assim como o interessado, conhece a fundo a raiz do negócio comum. Avulta a cultura do carimbo, da “cartorização”, da jurisdição graciosa como meio de oficialização de atos particulares absolutamente inanes à ordem jurídica justa. O Poder Judiciário deixou de ser a ultima ratio. Ao invés, é o primeiro passo na resolução de conflitos de interesses que vão desde o pequeno entrevero entre vizinhos até as grandes demandas societárias. Esta peculiar característica da formação da personalidade do homem brasileiro, tomada de empréstimo do homem ibérico por sua gênese, amesquinha as tentativas mais bem intencionadas de reduzir o passivo judicial, como, verbi gratia, as medidas paraestatais de solução de conflitos (mediação, arbitragem e quejandos) que não encontraram no solo brasileiro terreno virente, justamente pela carência do elemento judicial a lhe conferir a chancela estatal (absolutamente desnecessária nos povos de tradição oriental ou anglo-saxã).” (em Judiciário deve refletir sobre os impactos das decisões, artigo publicado no site Conjur, em 14.01.09, acessível em: http://www.conjur.com.br/2009-jan-14/poder_judiciario_refletir_impactos_economicos_decisoes ).
[16] Ele explica que essa “criatividade” é ainda uma herança do período de ditadura pelo qual passou o Brasil. Na explicação de Streck, como o cidadão quase não tinha direitos antes da Constituição de 1988, os juízes tinham de usar de todo conhecimento e imaginação para encontrar brechas e contornar o autoritarismo legal. Vinte anos depois, os juízes ainda não se acostumaram com a lei prevendo tantos direitos para o cidadão. “Os juízes, que agora deveriam aplicar a Constituição e fazer a filtragem das leis inconstitucionais, passaram a achar que sabiam mais do que o constituinte. Saímos da estagnação para o ativismo” (entrevista para o site Consultor Jurídico, intitulada “Justiça Lotérica – Ativismo judicial não é bom para a democracia”, publicada no dia 15.03.09, podendo ser acessada no seguinte link: http://www.conjur.com.br/2009-mar-15/entrevista-lenio-streck-procurador-justica-rio-grande-sul ).
[17] No art. 170, mas também dispersos por outros dispositivos.
[18] Claro que, mesmo focados na economia de mercado, o conjunto de princípios que regem a atividade econômica consagram importantes institutos de proteção ao ser humano.
[19] A Constituição está impregnada de uma série de valores e princípios que visam à realização da democracia econômica, por meio da regulação do mercado e da atividade econômica. O Estado deve garantir as condições para o crescimento econômico como condição para erradicar a pobreza, promovendo o crescimento justo e equitativo para suprir as necessidades de emprego, alimentação, energia, água e saneamento. O Estado apóia os agentes econômicos nacionais, na sua relação com o resto do mundo e, de modo especial, os agentes e atividades de contribuam positivamente para a inserção dinâmica do nosso país no sistema econômico mundial. O Estado incentiva e apóia, nos termos da lei, o investimento externo que contribua para o desenvolvimento econômico e social do país. É garantida, nos termos da lei, a coexistência dos setores público e privado na economia. Enfatiza-se, como deveres do Estado, em democracia econômica, os de assegurar uma concorrência sã, a fiscalização da atividade econômica para verificação do cumprimento das leis e regulamentos, a qualidade, regularidade e acessibilidade a bens de consumo e a serviços públicos fundamentais (água, electricidade, telecomunicações, etc.), a qualidade e o equilíbrio ambientais, o ordenamento territorial e o planeamento urbanístico equilibrados.
[20] Repercussões econômicas de decisões judiciais preocupam magistrados, entrevista do Des. Rogério Gesta Leal para o portal do STJ, publicada no dia 29.03.09, no seguinte endereço:
http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=91452
[21] Josilene Hernandes Ortolan e Norma Sueli Padilha, em “O Impacto Econômico do Direito: em busca de uma economia mais justa e de um direito mais eficiente”, trabalho publicado nos Anais do XVII Congresso Nacional do CONPEDI, realizado em Brasília – DF, nos dias 20, 21 e 22 de novembro de 2008.
[22] Josilene Hernandes Ortolan e Norma Sueli Padilha, ob. cit.
[23] Josilene Hernandes Ortolan e Norma Sueli Padilha, ob. cit.
[24] E também ao positivismo jurídico contemporâneo, principalmente na versão dada a esta corrente pelo professor Herbert Hart.
[25] Em alguns casos os juízes fundamentam suas decisões com base em argumentos de ordem (ou política) econômica, buscando formar uma regra utilitarista explícita, formulada com a intenção de servir ao bem-estar geral. Ronald Dworkin adverte, no entanto, que não se pode decidir esse tipo de questão por meio de uma análise que apenas associe meios a fins. Para ele, as diversas correntes da abordagem profissional da teoria do direito falharam porque ignoraram o fato crucial de que esses problemas têm relação com princípios (morais). Em algumas situações pode haver conflitos entre esses princípios e as necessidades práticas, de modo que se deve procurar um equilíbrio entre esses dois objetivos (da jurisdição). (Dworkin, Ronald. Levando os Direitos a sério. Martins Fontes. São Paulo. 2007. pág. 11).
[26] Movimento surgido a partir do início do século passado. John Chipman Gray e Oliver Wendell Holmes elaboraram os primeiros trabalhos com uma abordagem cética do processo judicial, desmascarando a doutrina ortodoxa. Nos anos 20 e 30 prosperaram as teorias do “realismo legal”, que tiveram em Jerome Frank e Felix Cohen alguns dos mais destacados expoentes. Segundo eles, a teoria ortodoxa fracassou porque tentou descrever o que os juízes fazem apenas concentrando-se nas regras que eles mencionam em suas decisões. Na verdade, os juízes tomam suas decisões de acordo com suas próprias preferências políticas e morais, e então escolhem uma regra jurídica apropriada como uma racionalização.
[27] Lenio Luiz Streck. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas. Da possibilidade à necessidade de respostas corretas em direito. Editora Lumen Juris. 2ª. ed. Rio de Janeiro. 2007.
[28] A Teoria da Argumentação Jurídica, de Robert Alexy, tem como fundamento principal a integração do discurso jurídico com o discurso prático geral. Em outras palavras, graças a uma argumentação de se que reconheça a força e a pertinência, o intérprete é direcionado para a decisão mais adequada (a melhor justificada). A racionalidade do discurso conduz à obtenção do resultado correto. Logo, correto é o discursivamente racional, o obtido por meio da construção argumentativa (ALEXY, Robert. Teoria da Argumentação Jurídica: A Teoria do Discurso Racional como Teoria da Justificação Jurídica. São Paulo, Landy, 2001).
[29] Lenio Luiz Streck. Ob. cit., p. 250.
[30] Dworkin ressalva que, embora os casos semelhantes devem ser decididos da mesma maneira, como exigência da igualdade e segurança jurídica, os precedentes não se constituem, no entanto, em fundamentos para uma interpretação imutável. O Juiz pode utilizar argumentos para demonstrar que uma determinada corrente jurisprudencial está errada. Valer-se-á de argumentos históricos ou de uma percepção geral da comunidade, para mostrar que um determinado princípio que já foi historicamente importante, hoje não é mais, não exerce força suficiente para gerar uma decisão jurídica. Também utilizará argumentos de moralidade política, demonstrando que tal decisão ou princípio fere a eqüidade ou é injusto. As interpretações dadas ao Direito são mutáveis e o que em uma época é incontestável, em outra sofre sérias críticas.
[31] Esses excertos do pensamento de Dworkin e de sua teoria dos direitos foram extraídos do artigo de Erika Juliana Dmitruk, intitulado “O Princípio da Integridade como modelo de interpretação construtiva do direito em Ronald Dworkin”, publicado na Revista Jurídica da UniFil – Centro Universitário Filadélfia, Ano IV – n. 4 – 2007, que pode ser acessado em: http://web.unifil.br/docs/juridica/04/Revista%20Juridica_04-11.pdf
[32] Lenio Streck faz uma crítica à distinção entre casos fáceis (easy cases) e casos difíceis (hard cases). Ele indica o equívoco de alguns críticos do positivismo que fazem uma divisão entre “procedimentos interpretativos próprios para os casos fáceis” e “procedimentos interpretativos para a solução de casos difíceis”, ao considerarem que casos jurídicos fáceis (simples) são resolvidos pelo juiz a partir de inferência lógico-dedutiva. Afinal, diz ele, “como saber se estamos em face de um caso simples ou de um caso difícil? Já não seria um caso difícil decidir se um caso é fácil ou difícil?”. Ele explica que, embora Dworkin também faça essa distinção, o faz por outra razão, pois trabalha com a noção de “casos difíceis” a partir da crítica que elabora ao positivismo discricionário de Hart. Acrescenta que, “ao fazer a distinção entre operações causais-explicativas (deducionismo) destinadas a resolver os casos simples e as “ponderações” calcadas em procedimentos que hierarquizam cânones e princípios, reduz-se o elemento essencial da interpretação a uma relação sujeito-objeto”. Ob. cit.
[33] Lenio Streck. Ob. cit., p. 249.
[34] Ob. cit, p. 101.
[35] Ob. cit., p. 46.
[36] Ob. cit., p. 36.
[37] Lenio Streck faz uma crítica à distinção absoluta entre normas e princípios, no que tange à visão de que os princípios se diferem das regras jurídicas por possuírem um maior grau de abstração. Ele explica que nem sempre isso ocorre, podendo haver regras com maior “abstralidade” do que alguns princípios. Veja-se o seguinte trecho de sua obra a esse respeito: “Refira-se, por derradeiro, que nada está a indicar esse caráter “de determinação finalístico” das regras e a “abstratalidade” dos princípios. Regras e princípios são constituídas de incertezas significativas (vaguezas e ambigüidades). Princípios podem ter mais “determinação finalística” que determinadas regras (v.g., o princípio da reserva legal, o princípio da ampla defesa, da presunção de inocência, da proibição da reformatio in pejus, etc, se comparados com a imprecisão semântica de regras como injusta agressão, abandono material e os pressupostos para a tutela antecipada, para citar apenas estas). Por isso, é que entre regra e princípio ocorre uma diferença, e não uma distinção estrutural” (ob. cit.).
[38] Ob. cit., p. 114.
[39] Lenio Streck, ob. cit., p. 06.
[40] Lenio Streck, ob. cit., p. 09.
[41] Josilene Hernandes Ortolan e Norma Sueli Padilha, fazendo alusão ao pensamento de Luís Roberto Barroso, ob. cit.
[42] Ob. cit., p. 369.
[43] Ob. cit., p. 292.
[44] Ob. cit., p. 372.
[45] Ob. cit., p. 296.