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10Jul/18

Lei nº 134/V/2001, de 20 Dezembro 2000, estabelece o regime, jurídico de tratamento de dados pessoais no sector das telecomunicações

Lei nº 134/V/2001, de 20 Dezembro 2000, estabelece o regime, jurídico de tratamento de dados pessoais no sector das telecomunicações (B. O. da República de Cabo Verde de 22 de  janeiro de 2001, I SÉRIE nº 2)

Actualmente ainda persiste no ordenamento jurídico cabo-verdiano um grande número de direitos praticamente sem garantia ou resposta.

O domínio da protecção dos direitos, liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos, designadamente o da protecção de dados pessoais, muito em especial no sector das telecomunicações é, seguramente, um dos que carece de profunda regulamentação.

Trata-se de um domínio de capital importância e que mereceu consagração no texto constitucional (artigo 44º). Efectivamente, a Constituição da República estabelece no seu artigo 44º, n.º3 que a «lei regula a protecção de dados pessoais constantes dos registos informáticos, as condições de acesso aos bancos de dados, de constituição e de utilização por autoridades públicas e entidades privadas de tais bancos ou de suportes informáticos dos mesmos».

Estabelece, ainda, a Constituição da República que a «todos é garantido acesso às redes informáticas de uso público, definido na lei, e o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras e as formas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifique por razões de interesse nacional, bem como o regime de limitação do acesso, para a defesa dos valores jurídicos tutelados pelo disposto no n.º 4 do artigo 47º»

É, pois, neste contexto político-constitucional que se insere a aprovação da presente lei.

Com efeito, a matéria de protecção de dados pessoais no sector das telecomunicações carece de regulamentação, por forma a se estabelecer um quadro normativo claro e moderno, que tenha em conta a salvaguarda dos direitos, liberdades e garantías fundamentais dos cidadãos e a liberdade de acesso à informação, de comunicação e circulação de dados, numa perspectiva de harmonia e equilíbrio.

Tratando-se de matéria de reconhecida sensibilidade, expressamente reconhecida, aliás, pela Constituição da República, importa definir com clareza a forma como esses dados devem ser tratados no sector das telecomunicações, de acordo com as exigências do regime jurídico geral da protecção de dados pessoais das pessoas singulares.

A presente lei estabelece um quadro claro de definições fundamentais («assinante», «utilizador», «rede pública de telecomunicações») e serviço de telecomunicações»), que se revelam de grande importância para a interpretação e aplicação do presente diploma.

O regime que ora se consagra abrange o tratamento de dados pessoais em ligação com a oferta de serviços de telecomunicações acessíveis ao público nas redes públicas de telecomunicações, nomeadamente através da rede digital com integração de serviços (RDIS) e das redes públicas móveis digitais.

Alguns dos aspectos do regime jurídico estabelecido, nomeadamente no que se refere à apresentação e restrição da identificação da linha chamadora e da linha conectada e ao reencaminhamento automático de chamadas, são aplicáveis às linhas de assinante ligadas centrais digitais e, sempre que tal seja tecnicamente possível e não exija esforço económico desproporcionado, às linhas de assinante ligadas a centrais analógicas.

Foram estabelecidas regras claras e rígidas, quer do ponto de vista organizacional, quer do ponto de vista técnico, em matéria de segurança dos serviços de telecomunicações acessíveis ao público prestados e, quando necessário, no que respeita à segurança da rede, bem como em matéria de confidencialidade das comunicações.

De igual modo, a presente lei prevê de forma tipificada o regime de tratamento dos dados de tráfego para efeitos de facturação, bem como um regime sancionatório para os casos de cometimento de infracções.

Prevê-se, ainda, o diploma a designação pelo Conselho de Ministros de uma autoridade independente que intervém com entidade reguladora e fiscalizadora, com poderes de autoridade, designadamente em materia de aplicação de coimas em certos casos.

Uma vez que se está no domínio da protecção de dados pessoais, o diploma prevê a intervenção da Comissão Parlamentar de Fiscalização, organismo a ser criado por diploma especial e a quem compete o controlo e a fiscalização, em geral, de tratamento de dados pessoais por parte de entidades públicas ou privadas.

 

Assim;

Por mandato do Povo, a Assembleia Nacional decreta, nos termos da alínea m) do artigo 175º  da Constituição, o seguinte:

 

Artigo 1º (Objecto)

A presente lei estabelece o regime, jurídico de tratamento de dados pessoais no sector das telecomunicações.

 

Artigo 2º (Âmbito)

  1. A presente lei aplica-se ao tratamento de dados pessoais no sector das telecomunicações.
  2. As disposições da presente lei asseguram a protecção dos direitos e interesses legítimos dos assinantes que sejam pessoas colectivas compatíveis com a natureza destas.
  3. As excepções à aplicação da presente lei que se mostrem estritamente necessárias para protecção da segurança do Estado, da defesa, da segurança pública e da prevenção, investigação ou repressão de infracções penais são definidas em legislação especial.

 

Artigo 3º (Definições)

Para efeitos da presente lei e sem prejuízo das definições constantes do regime jurídico geral da protecção de dados pessoais das pessoas singulares, entende-se por:

a) «Assinante»: qualquer pessoa singular ou colectiva que seja parte num contrato com o prestador de serviços de telecomunicações acessíveis ao público para a prestação de tais serviços;

b) «Utilizador»: qualquer pessoa singular que utilize um serviço de telecomunicações acessíveis ao público para fins privados ou comerciais, sem ser necesariamente assinante desse serviço;

c) « Rede pública de telecomunicações »: o conjunto de meiosfísicos, denominados infra-estruturas», ou electromagnéticos que suportam a transmissão, recepção ou emissão de sinais e utilizado, total ou parcialmente, para o fornecimento de serviços de telecomunicações acessíveis ao público;

d) «Serviço de telecomunicações»: a forma e o modo de exploração do encaminhamento ou distribuição de informação através de redes de telecomunicações, com excepção da radiodifusão sonora e da televisão.

 

Artigo 4º (Serviços abrangidos)

  1. A presente lei é aplicável ao tratamento de dados pessoais, em ligação com a oferta de serviços de telecomunicações acessíveis ao público nas redes públicas de telecomunicações, nomeadamente através da rede digital com integração de serviços (RDIS) e das redes públicas móveis digitais.
  2. Os artigos 9º a 11º são aplicáveis às linhas de assinante ligadas a centrais digitais e, sempre que tal seja tecnicamente possível e não exija esforço económico desproporcionado, às linhas de assinante ligadas a centrais analógicas.
  3. Compete a uma autoridade independente designada por Resolução do Conselho de Ministros confirmar os casos em que seja tecnicamente impossível ou que exijam um investimento desproporcionado para preencher os requisitos dos artigos 9º a 11º e comunicar esse facto à Comissão Parlamentar de Fiscalização.

 

Artigo 5º (Segurança)

  1. O prestador de um serviço deve adoptar todas as medidas técnicas e organizacionais necessárias para garantir a segurança dos serviços de telecomunicações acessíveis ao público que presta e, se necessário, no que respeita à segurança da rede, deve fazê-lo conjuntamente com o operador da rede pública que suporta o serviço.
  2. As medidas referidas no número anterior devem ser adequadas à prevenção dos riscos existentes, tendo em conta a proporcionalidade dos custos da sua aplicação e o estado de evolução tecnológica.
  3. Em caso de risco especial de violação da segurança da rede, o prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público deve informar os assinantes da existência desse risco, como das soluções possíveis para a evitar e respectivos custos.

 

Artigo 6º (Confidencialidade das comunicações)

  1. Os prestadores de serviços e os operadores de rede devem garantir a confidencialidade e o sigilo das comunicações através dos serviços de telecomunicações acessíveis ao público e das redes públicas de telecomunicações.
  2. É proibida a escuta, a colocação de dispositivos de escuta, o armazenamento ou outros meios de intercepção ou vigilância de comunicações por terceiros sem o consentimento expresso dos utilizadores com excepção dos casos especificamente previstos na lei.
  3. O disposto na presente lei não obsta à gravação de comunicações, no âmbito de práticas comerciais lícitas, para o efeito de prova de uma transacção comercial ou de qualquer outra comunicação de negócios, desde que o titular dos dados tenha sido disso informado e dado o seu consentimento expresso.

 

Artigo 7º (Dados de tráfego e de facturação)

1. Os dados do tráfego relativos aos utilizadores e assinantes tratados para estabelecer chamadas e armazenados pelo operador de uma rede pública de telecomunicações ou pelo prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público devem ser apagados ou tornados anónimos após a conclusão da chamada.

2. Para finalidade de facturação dos assinantes e dos pagamentos das interligações, podem ser tratados os seguintes dados:

a) Número ou identificação, endereço e tipo de posto do assinante;

b) Número total de unidades a cobrar para o período de contagem, bem como o tipo, hora de início e duração das chamadas efectuadas ou o volume de dados transmitidos;

c) Data da chamada ou serviço e número chamado;

d) Outras informações relativas a pagamentos, tais como pagamentos adiantados, pagamentos a prestações, cortes de ligação e avisos.

3. O tratamento referido no número anterior apenas é lícito até final do período durante o qual a factura pode ser legalmente contestada ou o pagamento reclamado.

4. Para efeitos de comercialização dos seus próprios serviços de telecomunicações, o prestador de um serviço de telecomunicações acessível ao público pode tratar os dados referidos no número 2 se o assinante tiver dado o seu consentimento.

5. O tratamento dos dados referente ao tráfego e à facturação deve ser limitado ao pessoal das operações das redes públicas de telecomunicações 3 ou dos prestadores de serviços de telecomunicações acessíveis ao público encarregados da facturação ou da gestão do tráfego, da informação e assistência a clientes, da detecção de fraudes e da comercialização dos próprios serviçosde telecominicações do prestador e deve ser limitado ao que for estritamento necessário para efeitos das referidas actividades.

6- O disposto nos números anteriores não prejudica o direito das autoridades competentes serem informadas dos dados relativos à facturação ou ao tráfego nos termos da legislação aplicável, para efeitos da resolução de litígios, em especial os litígios relativos às interligações ou à facturação.

 

Artigo 8º (Facturação detalhada)

  1. O assinante tem o direito de receber facturas detalhadas ou não detalhadas.
  2. No caso de ter optado pela facturação detalhada, o assinante tem o direito de exigir do operador a supressão dos últimos quatro dígitos.
  3. As chamadas facultadas a título gratuito, Incluindo chamadas para serviços de emergência e de assistência, não devem constar da facturação detalhada.

 

Artigo 9º (Apresentação e restrição da identificação da linha chamadora e da linha conectada)

  1. Quando for oferecida a apresentação da identificação da linha chamadora, o utilizador chamador deve ter a possibilidade de, através de um meio simples gratuito, e por chamada eliminar a apresentação da identificação da linha chamadora.
  2. O assinante chamador deve ter, linha a linha a possibilidade referida no número anterior.
  3. Quando for oferecida a apresentação da Identificação da linha chamadora, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples e gratuito, dentro dos limites da utilização razoável desta função impedir a apresentação da identificação da linha chamadora das chamadas de entrada.
  4. Quando a apresentação da identificação da linha chamadora for oferecida e a identificação dessa linha for apresentada antes do estabelecimento da chamada, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples, rejeitar chamadas de entrada sempre que a apresentação da identificação da linha chamadora tiver sido eliminada pelo utilizador ou pelo assinante autor da chamada.
  5. Quando for oferecida a apresentação da identificação da linha conectada, o assinante chamado deve ter a possibilidade de, através de um meio simples e gratuito, eliminar a apresentação da identificação da linha conectada ao utilizador autor da chamada.
  6. Se for oferecida a apresentação da identificação da linha chamadora ou da linha conectada, os prestadores de serviços de telecomunicações acessíveis ao público devem informar o público do facto e das possibilidades referidas nos números 1 a 5, designadamente nos contratos de adesão.

 

Artigo 10 (Excepções)

1. Os operadores de uma rede pública de telecomunicações e os prestadores de um serviço de telecomunicações acessível ao público podem anular a eliminação da apresentação da identificação da linha chamadora, quando compatível com os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade:

a) Por um período de tempo não superior a 30 dias, a pedido, feito por escrito, de um assinante que pretenda determinar a origem de chamadas mal intencionadas ou incomodativas, caso em que os números de telefone dos assinantes chamadores que tenham eliminado a identificação da linha chamadora são registados e comunicados ao assinante chamado pelo operador da rede pública de telecomunicações ou pelo prestador do serviço de telecomunicações acessível ao público,

b) Numa base linha a linha, para as organizações com competência legal para receber chamadas de emergência, designadamente as forças policiais, os serviços de ambulância e os bombeiros.

2. A existência do registo e da comunicação a que se ,refere a alínea a) do numero anterior deve ser objecto de informação ao público e a sua utilização deve ser restringida ao fim para que foi concedida.

 

Artigo 11º (Reencaminhamento automático de chamadas)

Os operadores de uma rede pública de telecomunicações e os prestadores de um serviço de telecomunicações acessível ao público devem asegurar aos assinantes, gratuitamente e através de um meio simples, a possibilidade de interromper o reencaminhamento automático de chamadas efectuado por terceiros para o seu equipamento terminal.

 

Artigo 12º (Listas de assinantes)

1. Os dados pessoais inseridos em listas impressas ou electrónicas de assinantes acessíveis ao público ou que se possam obter através de serviços de informações telefónicas devem limitar-se ao estritamente necessário para identificar um determinado assinante, a menos que este tenha consentido inequivocamente na publicação de dados pessoais suplementares.

2. O assinante, tem o direito de, a seu pedido e gratuitamente:

a) Não figurar em determinada lista, impressa ou electrónica;

b) Opor-se a que os seus dados pessoais sejam utilizados para fins de marketing directo;

c) Solicitar que o seu endereço seja omitido total ou parcialmente;

d) Não constar nenhuma referência reveladora do seu sexo.

3. Os direitos a que se refere o número 2 são conferidos aos assinantes que sejam pessoas singulares ou pessoas colectivas sem fim lucrativo.

 

Artigo 13º (Chamadas não solicitadas)

  1. As acções de marketing directo com utilização de aparelhos de chamadas automáticos ou de aparelhos de fax carecem do consentimento prévio do assinante chamado.
  2. O assinante tem o direito de se opor, gratuitamente a receber chamadas não solicitadas para fim de marketing directo realizadas por meios diferentes dos referidos no número anterior.
  3. Os direitos a que se referem os números anteriores são conferidos aos assinantes quer sejam pessoas singulares quer colectivas.
  4. As obrigações decorrentes do presente artigo recaem sobre as entidades que promovam as acções de marketing directo.

 

Artigo 14º (Características técnicas e normalização)

O cumprimento da presente lei não pode determinar a imposição de requisitos técnicos específicos dos equipamentos terminais ou de outros equipamentos de telecomunicações que impeçam a colocação no mercado e a livre circulação desses equipamentos.

 

Artigo 15º (Preterição de regras de segurança e violação do dever de confidencialidade)

1. Constituem contra – ordenação, punível com a coima nos termos do respectivo regime geral:

a) A preterição de regras de segurança previstas no artigo 5º;

b) A violação do dever de confidencialidade previsto no artigo 6º.

2. São sempre puníveis a tentativa e a negligência.

 

Artigo 16º (Outras contra – ordenações)

1. Praticam contra-ordenação, punível com coima de 100.000$00 a 1,000.000$00, as entidades que:

a) Não assegurarem o direito de Informação ou de obtenção do consentimento, nos termos previstos no artigo 6º, n.º 3;

b) Não observarem as obrigações estabelecidas nos artigos 7º a 13º.

2. A coima é agravada para o dobro dos seus limites mínimo e máximo se a contra-ordenação for praticada por pessoa colectiva.

 

Artigo 17º (Processamento, aplicação e destino de coimas)

  1. Compete à Comissão Parlamentar de Fiscalização o processamento das contra – ordenações e a aplicação das coimas por violação dos artigos 6º, n.º 3, 7º, 12º e 13º do presente diploma.
  2. O Processamento das restantes contra-ordenações compete à autoridade independente referida, no número 3 do artigo 4º.
  3. As receitas Proveniente das coimas aplicadas pela Comissão Parlamentar de Fiscalização revertem-se a favor do Estado.
  4. As receitas provenientes das coimas aplicadas pela autoridade independente referida no número anterior revertem-se em 60% para essa autoridade e em 40% para o Estado.

 

Artigo 18º (Disposições transitórias)

  1. É dispensado o consentimento previsto no número 4 do artigo 7º relativamente ao tratamento de dados pessoais já em curso à data da entrada em vigor da presente lei, desde que os assinantes sejam informados deste tratamento e não manifestem o seu desacordo no prazo de 60 dias.
  2. O artigo 12º não é aplicável às edições de listas publicadas antes da entrada em vigor da presente lei ou que o sejam no prazo de um ano, sem prejuízo do cumprimento das obrigações previstas pela legislação anterior.

 

Artigo 19º (Legislação subsidiária)

Em tudo o que não esteja previsto na presente lei, designadamente em matéria de tutela administrativa e jurisdicional, contra-ordenações e sanções e responsabilidade civil, são aplicáveis, consoante o caso, as disposições do regime jurídico geral da protecção de dados pessoais das pessoas singulares, as normas sancionatórias previstas na legislação sobre as telecomunicações, o regime jurídico geral das contra-ordenações e de responsabilidade civil.

 

Artigo 20º (Entrada em vigor)

A presente lei entra em vigor trinta dias após a sua publicação.

 

Aprovada em 20 de Dezembro de 2000.

 

O Presidente da Assembleia Nacional, António do Espírito Santo Fonseca.

 

Promulgado em 10 de Janeiro de 2001.

 

Publique-se.

 

O Presidente da República, ANTÓNIO MANUEL MASCARENHAS GOMES MONTEIRO.

 

Assinada em 13 de Janeiro de 2001.

O Presidente da Assembleia Nacional, António do Espírito Santo Fonseca.